Cerimônias para Òrìsànlá-Obàtálá
- Done Carmen ty Opara.
- 27 de mar. de 2016
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As cerimônias públicas para Òrìsànlá em Ilê-Ifé comemoram acontecimentos históricos. Antigamente, as festas duravam nove dias e foram posteriormente reduzidas para cinco. Como estão em concordância com a semana ioruba de quatro dias, começam e terminam no dia consagrado a Obàtálá. Nos dois casos observados, começaram no dia imediato ao primeiro quarto da lua, respectivamente, em 13 de janeiro de 1977 e em 1º de fevereiro de 1978. Foram realizados sacrifícios de cabras no templo de Óbàtálá, no ilésìn de Ideta-Ilê, onde se encontram as imagens de Óbàtálá-Òrìsànlá e de sua mulher Yemoo. Uma parte do sangue é derramada sobre as imagens que, em seguida, são lavadas com infusão de folhas colhidas na floresta de Yemoo. Essas folhas são de diferentes variedades, entre as quais figuram as plantas calmantes: Ódúndún (Kalanchoe crenata), àbámódá (Bryophyllum pinnatum), òwú (Gossypium sp.), efinrin (Ocimun viride), rinrin (Peperomnia pellucida), tétérégun (Costus afer), etc.

Em seguida, as duas imagens são enfeitadas com uma série de traços e pontos brancos feitos com Èfun. O sacerdote mais importante, o Óbàlásé, guarda de Obàtálá, e Óbàlásé, guarda do Òrìsà Alásé, dança por muito tempo nesse primeiro dia ao som dos tambores ìgbìn, próprio do culto de Òrìsànlá. São tambores pequenos e baixos, apoiados sobre pés, um macho e outro fêmea. O ritmo é marcado pelos eru, ferros achatados em forma de “T” “T”, batidos uns no outro. No dia seguinte, Óbàlálé e Obàlásé fazem abluções com as mesmas infusões que serviram na véspera para Òrìsànlá e Yemowo; seus corpos são igualmente enfeitados com desenhos feitos com Èfun. As imagens são bem enroladas em pano branco e levadas, de manhã cedinho, em procissão desde Ideta- Ilê até Ideta-Oko. Todos os ingredientes da oferenda — ibó òrìsà — a ser feita são levados até lá. Essa oferenda consta de dezesseis caracóis, dezesseis ratos, dezesseis peixes, dezesseis nozes de cola e limo da costa. O dia será passado em Ideta-Oko, lembrando o exílio de Òrìsànlá-Obà-Ìgbò quando teve de deixar o palácio de Ifé.

No momento da chegada à floresta, faz-se uma pequena parada diante de uma árvore isìn, “a que é adorada”, e o cortejo penetra mais adentro numa vasta clareira, cercada de grandes árvores e margeada de montículos de terra que parecem ser ruínas de construções antigas. No centro, encontra se uma espécie de grande pote emborcado com um pequeno furo a meia altura, através do qual pode se ver o crânio de animais sacrificados nos anos anteriores. As imagens são desenroladas e colocadas no chão, de costas para o pote; Òrìsànlá à direita e Yemowo à esquerda, como no ilésìn em Ideta-Ilê. Todos os participantes sentam-se em silêncio na floresta calma e sombria. Pouco a pouco a multidão se amontoa. Os tambores ìgbìn tocam de vez em quando, acompanhando os cantos e os oríkì de Obàtálá e Yemowo. Sacrifica-se uma cabra. Faz-se uma adivinhação, com as quatro partes de uma noz de cola, para saber se os deuses estão satisfeitos. A cabeça do animal é separada do corpo e jogada embaixo do grande pote. Recomeçam os cantos acompanhados pelos tambores. Os sacerdotes dançam. Obàlálá, com ar distante e crispado, está em transe, possuído por Òrìsànlá.

No entardecer, dois mensageiros do Oòni de Ifé chegam e param à entrada da floresta, perto da árvore isìn. Traz da parte de seu senhor, descendente de Odòduwà, uma cabra como oferenda; antigamente era um ser humano que deveria ser sacrificado. O animal é levado para uma pequena clareira, contígua ao local da reunião. Já quase à noite e a cabeça do animal é presa no chão por uma forquilha. Óbàlásé, com o rosto tenso e entorpecido pelo transe, dança ao redor da pequena clareira e faz várias idas e vindas ao local onde estão as imagens dos òrìsas. Em seguida, ele pega um dos ferros eru, em forma de “T” “T”, e com ele bate com força na cabeça da cabra, matando-a. Molha suas mãos no sangue que escorre do corte e vai passá-las na cabeça das imagens de Òrìsànlá e Yemowo.

Um ajudante de Óbàlálásé arrasta, com a forquilha, a cabra abatida, evitando tocá-la, e a lança no mato. A multidão grita: “Gbákú ló, gbárùn ló!!!” “Leva a morte para longe, leva as doenças para longe" Em contraste com a primeira cabra sacrificada, cuja carne foi cozida e distribuída para ser ritualmente comida pelos presentes, em comunhão com os deuses, a carne da segunda cabra, que substituiu a vítima humana, não pode ser tocada nem comida, pois seria atrair sobre si a morte e as doenças... e praticar antropofagia. Terminada a cerimônia desse dia, as imagens dos deuses são novamente enroladas nos panos brancos, levadas a Ideta-Ilê e reinstaladas no ilésìn até o ano seguinte. No último dia, consagrado a Yemoo, os sacerdotes e seus auxiliares vão à floresta sagrada dessa divindade, a Ita-Yemoo. Levam para ali um acento de madeira esculpida, àgá Yemowo, devidamente lavado e purificado com a infusão de folhas e enfeitado com traços brancos. Um dos sacerdotes, dedicado a Yemoo, entra em transe, possuído por essa divindade. A expressão de seu rosto, com seu ar distante, lembram o transe de Óbàlásé na floresta de Ideta-Oko, porém mais calmo e tranqüilo. Transformando-se momentaneamente em Yemoo, o sacerdote é revestido com um grande pano branco e amarra em sua cabeça um turbante também branco. Seguida por uma grande multidão, na qual predominam as mulheres, algumas das quais tiveram filhos por sua intercessão, Yemoo, encarnava, vai sentar-se em sua cadeira, em frente ao palácio de Oòni. Porém o descendente de Odùduwà não se apresenta e Yemoo retira-se para o templo de Ideta-Ilê. Esta visita de Yemoo é repetida duas vezes mais sem que o Oòni apareça; entretanto, a cada vez, ele envia nozes de cola a Ideta-Ilê por um mensageiro.

Não obtivemos explicação sobre o sentido preciso dessa parte do ritual. Parece tratar-se de uma referência aos esforços sucessivos que antigamente fez Yemoo para restabelecer a paz entre Òrìsànlá e Odùduwà e a acolhida reticente reservada por este último aos esforços de pacificação.

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